29 de set. de 2010

O passado que moldou o futuro

Existiu há um tempo, um garoto vindo de família humilde, e essa história é apenas um exemplo de como o presente pode prejudicar o futuro de alguém que você ainda não conhece.
Para eu poder começar a falar (ou escrever) desse rapaz, preciso primeiro, contar-lhes a história dos seus pais, e de como eles se conheceram. Seu pai era considerado o “cara maneiro” daquela época, podia não ser o mais cogitado em relação à beleza, mas sua simpatia e suas habilidades em qualquer esporte o fizeram ter uma reputação invejável, o bastante pra, em pouco tempo, ter todas as menininhas querendo o conhecer, ou estar simplesmente perto dele. Ele era de família rica, o pai era ferroviário, a mãe costureira renomada na cidade, por isso sempre teve tudo o que sempre quis, ele virou um garoto mimado, pois acredito que ninguém nasce mimado, a educação é muito influente nesse ponto, sabem como é, alguns de vocês, leitores, já conheceram ou conhecem alguém assim.
Em uma noite, num acampamento, que eu consideraria hippie, porém, sem drogas ilícitas é claro, esse papai mimado conheceu uma moça que lhe fez acreditar em algo diferente, essa garota era linda, uma “Morenaça”, sempre com um sorriso estampado no rosto e um corpo que invejaria a Ivete Sangalo hoje em dia, essa garota seria, futuramente, a mamãe desse rapaz que irei contar a historia posteriormente. Os dois sentiram a mesma coisa, e eu não estava lá, mas, acredito que na cabeça deles passava o mesmo pensamento: “Ele (a) é muita areia pro meu caminhãozinho.”. A morenaça vinha de uma família muito humilde, de oito irmãos, criados pelo pai e a madrasta, pois a mãe biológica os deixou quando todos tinham de sete a doze anos de idade, desde então foi uma batalha para aquela família, virou um círculo de sustentação, tudo o que ganhavam era apenas pra sobrevivência, nada de carro novo, casa nova, geladeira nova, só compravam coisas novas quando realmente necessitavam. O acampamento era uma válvula de escape, aonde todos iam para aliviar a tensão de mais uma semana batalhadora.
O Papai gostava muito de tocar violão (tanto que hoje em dia é músico renomado na cidade e região onde mora), e nesse acampamento, enquanto ele ficava tocando seu violão para animar a noite, sua futura mulher estava “só de bico” no cara que todas as menininhas do acampamento estavam tentando “tirar uma lasquinha”, e resumindo ao ápice da historia eles terminaram juntos e decidiram batalhar juntos para uma vida diferente e melhor, decidiram casar. Tiveram um casamento simples, nada de anúncios enormes em jornais ou estações de rádio. Ambos trabalhavam como funcionários em firmas grandes, ganhavam mais que salários mínimos, assim conseguiam manter-se bem e ainda adquirir coisas novas, no entanto, como nada é perfeito, depois de um tempo, o papai começou a ter ataques de ciúmes com a sua companheira, o que a levou a sair do emprego, enquanto ele saía também de seu emprego para montar um grupo musical, pois ele sempre detestou ter que trabalhar como um “escravo”, como ele mesmo dizia. Aos poucos a família foi desestruturando-se, e quando não podia piorar, a mamãe ficou grávida, e deu a luz no ano de 1988 para esse rapaz que chegou de intruso na vida dos dois. As coisas começaram a piorar, e o dinheiro não era mais suficiente para sustentar-se, pois a mãe não trabalhava mais e o pai estava recém iniciando os negócios como Músico, assim os dois foram obrigados a se mudar para a casa da mãe do pai (no caso, a vovó do rapaz), ficaram ali por pouco tempo até conseguirem, por contatos do pai um trabalho como ecônomos num clube de festas, dessa forma eles teriam uma nova casa sem aluguel e noites de festas para o papai mostrar o seu trabalho. Depois de toda essa confusão financeira, e essa falta de “planejamento vivencial” (o que durou cinco anos), o destino os trouxe mais uma surpresa, o rapaz ganhara uma irmãzinha, as coisas complicaram.
A família, agora finalmente completa, volta a residir na casa da mãe do papai, eles não vivem mal até hoje, têm tudo o que a globalização ofereceu em relação à tecnologia e conforto, porém, o pai com uma família formada e quarenta e poucos anos nas costas ainda “morava com os pais”.

O rapaz cresceu em meio a tanta confusão, tanto financeiramente como emocionalmente, trocou de colégio três vezes, não se fixou em nenhum grupo de amigos, passou boa parte de sua vida sem nenhum “amigo de infância”, e quando chegou ao segundo ano do ensino médio, alguma coisa aconteceu com ele, ninguém nunca soube me dizer o que pôde ter acontecido, mas depois desse tal acontecimento, ele não dependia mais de nada, se a vida inteira ele fora ingênuo e quieto, agora ele pretendia conhecer as pessoas, conhecer historias novas, aprender experiências mais ousadas, assim, conheceu muita gente em situações iguais ou piores que a dele, onde o fator financeiro era o mínimo a se preocupar. Como o pai ele também tocava violão, usou desse artifício para criar novas amizades e esquecer aquele passado chato que tivera, renovou suas idéias sobre tudo e sobre todos, cansado de ver tanta ignorância não acreditava mais em ninguém, sempre havia segundas intenções nas amizades que criava (por parte deles), e nunca estava satisfeito.
Ele era do tipo simpático, fazia de tudo para agradar ou ajudar alguém, mesmo que não o conhecesse direito, gostava de criar novas amizades, acreditava que assim ampliaria seu conhecimento, e “pegaria” mais meninas é claro, e foi numa dessas novas amizades que ele acabou encontrando uma companheira para passar seus dias juntos, e é exatamente aqui que eu queria chegar.
A menina não tinha defeito, era linda, simpática e inteli... Bom, não era muito esperta não, mas pra ele estava perfeito, nunca namorara antes e agora finalmente conhecera alguém interessante. A alegria não duraria muito, o garoto não era acostumado a ter alguém do seu lado, principalmente na sua casa. Até então quem o visitava eram seus parentes de longe e seus dois amigos que nem entravam, só passavam e chamavam-no pra sair, agora tinha mudado tudo, ele não sabia como agir, o trauma de infância renascia nele, o rapaz que ele era antes do segundo ano do ensino médio voltou a “dar as caras”, sentia-se rebaixado novamente, a pressão aumentava, no entanto, agora ele não era mais um garoto, estava cursando faculdade, tinha uma namorada, trabalhava, mas ainda morava com os pais, o namoro que era pra ser uma experiência feliz pra ele estava, na verdade o destruindo aos poucos, não demorou muito pra ele terminar o namoro inventando qualquer desculpa esfarrapada. A sua namorada baixaria o céu por ele, pra ela não existia ninguém que pudesse o substituir, porém ele não conseguia mais seguir com aquilo. Na verdade ele não suportava a idéia de que ele ainda morava com os pais, não tinha sua própria casa, nem seu próprio carro, sua família possuía um carro popular, seu pai ainda morava “com os pais”, passava o mês inteiro batalhando pra ter apenas um salário mínimo que o sustentava por muito pouco tempo, ele foi cansando, não via mais alternativas, decidiu, desde então nunca mais namorar, criou um medo enorme dentro dele que sempre quando a sua família comentava sobre namoro ele se aquietava e não falava mais com ninguém, praticamente esqueceu-se de quem tinha se tornado e voltou a ser o menino frágil que era quando criança. O que faltava pra ele era humildade, saber aceitar que ele não vinha de berço de ouro, e que a vida não é comparação de bens materiais, digamos que isso foi um egoísmo muito forte ao ponto de ele não querer mais namorar ninguém que tivesse uma vida melhor que a dele, dizia que essas pessoas mereciam pessoas melhores, com o mesmo nível financeiro ou maior, e que ele não desejaria prejudicar uma formação de família nesse nível, ele é ciente do que aconteceu com ele e não quer que ninguém passe por isso também. Ele é a favor da idéia que “o amor não enche barriga”, vive numa realidade paralela a nossa agora, preferiu montar um mundo só dele, sem comprometer outras pessoas, sem deixar que pessoas novas se aproximem.
É incrível como o que se faz no passado pode refletir emocionalmente na vida de outra pessoa aleatória, nesse caso o próprio filho do casal que se conheceu no acampamento, eles não tiveram nenhum interesse em crescer financeiramente e nem pensaram no futuro, foram levando a vida como deu, não podemos também colocar toda a culpa nos dois, mas eles tiveram sim, uma grande porcentagem de irresponsabilidade, o que acabou deixando o filho deles com problemas de relação social, a outra parte da culpa vai para o filho que não aceita a condição em que vive, e pensa com cabeça de rico, como se ele fosse o único com problemas financeiros no mundo, como se nascer rico fosse uma escolha, essa falta de humildade da parte dele só o levou mais pra baixo ainda. Não encontrei nenhuma análise construtiva e produtiva pra encerrar esse texto, mas fica aqui com vocês leitores, uma historinha bem divertida, um abraço a todos, obrigado a quem leu.

2 comentários:

  1. a historia é muito boa, e o texto muito bem escrito! ficou bem legal, parabens. beijo Marfa

    ResponderExcluir
  2. Que bom poder ler algo com qualidade hoje em dia. Thales, acho que tu poderia investir nisso, tu escreves super bem.
    A tua crônica, sim podemos chamá-la assim, está bem elaborada, a ideia central é muito boa e se eu parar um pouquinho e viajar eu consigo ver isso como um prólogo de uma pequena história talvez, ou depedendendo do desenvolvimento, um livro substancial.

    Parabéns! E se eu puder te dar um conselho, não pára de escrever, tu tens talento.

    ResponderExcluir